A conquista do Norte

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O cafeicultor Laerte Braun, que em 1977 se mudou com a família de Vila Pavão para Alto Alegre dos Parecis, município distante 720 quilômetros de Porto Velho, capital de Rondônia. Com 50 mil plantas de café conilon em uma área de 15 hectares, a família colhe em média 120 sacas/ha. Foto: Divulgação

A cafeicultura em Rondônia desponta no cenário nacional pelas mãos dos capixabas que migram em busca de melhores condições de vida levando consigo a paixão pelo cultivo do conilon

Tradicionalmente cultivado nos Estados do sudeste brasileiro, Paraná e Bahia, o café tem sido destaque em uma região distante dos grandes polos de produção: na Amazônia Brasileira. Mais especificamente no estado de Rondônia, a produção está na casa dos 2 milhões de sacas por ano, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

O cultivo no Estado começou na década de 1960. Nos primeiros anos as lavouras eram formadas por plantações de arábica que aos poucos foi substituída pelo conilon, pelas mãos de agricultores capixabas. A baixa altitude, associada ao clima quente, típicas da região amazônica, contribuíram para uma melhor adaptação do conilon.

Engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Rondônia desde 2011, o capixaba Marcelo Curitiba Espindula diz que a área plantada chegou perto de 200 mil hectares, mas diminuiu dos anos 2000 para cá, porém a produtividade aumentou.

“Do início dos anos 2000 até 2019, a área plantada do Estado, que era de aproximadamente 200 mil hectares, foi reduzida para pouco mais de 72 mil hectares. Em contrapartida, a produtividade triplicou, saindo de cerca de 10 sacas e chegando a mais de 32 sacas por hectare em 2019, o que manteve a produção do estado praticamente estável, mesmo com a redução da área plantada”, aponta Marcelo.

Engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Rondônia, o capixaba Marcelo Curitiba Espindula destaca: “O crescimento da produtividade é positivo do ponto de vista econômico, mas é ainda mais relevante se considerado os benefícios ambientais resultantes da redução da necessidade de desmatamento da floresta amazônica”. Foto: Renata Silva

Curitiba ressalta ainda que esse aumento na produção é positivo, econômica e ambientalmente falando. “O crescimento da produtividade é positivo do ponto de vista econômico, mas é ainda mais relevante se considerado os benefícios ambientais resultantes da redução da necessidade de desmatamento da floresta amazônica”, destaca o pesquisador.

O crescimento da eficiência produtiva dos novos cafezais tem sido associado ao uso de clones altamente produtivos, adaptados ao clima da Amazônia. Para Marcelo, porém, esse é o principal fator, mas não o único. “Além da genética superior, o sucesso da cafeicultura rondoniense também é resultado da melhoria das práticas de manejo, como a redução do espaçamento de plantio e técnicas de poda”.

Curitiba explica o que mudou na prática: “As lavouras antes cultivadas em espaçamentos de 3 a 4 metros entre linhas de plantio e de 1,5 a 2m entre plantas, deram espaço a lavouras mais adensadas, 3 x 1m por exemplo, que resultam em densidades acima de 3.000 plantas por hectare. Com a redução do espaçamento, houve também a redução do número de hastes por planta; a introdução da técnica de poda dos ramos plagiotrópicos após a colheita e, por fim, a adoção da Poda Programada de Ciclo – PPC”, concluí.

Cafeicultores capixabas fazem história em Rondônia

Entre os anos de 1977 e 1990 a crise na cafeicultura capixaba e a falta de política para agricultura familiar fez com que muitos capixabas, especialmente das regiões norte e noroeste do Espírito Santo, migrassem para Rondônia. Na bagagem levaram anos de tradição no cultivo de conilon e ajudaram transformar a cafeicultura de Rondônia, substituindo as lavouras de arábica por lavouras de conilon.

Marcelo conta que atualmente, boa parte dos cafeicultores do estado de Rondônia são capixabas, ou filhos de capixabas. Por isso, é comum encontrar produtores do Espírito Santo entre os campeões de produtividade e de concursos de qualidade do estado.

Foi o que fez Vantuir Dubberstein e a esposa Nilva Schreeder Dubberstein. Em 1989 deixaram São Gabriel da Palha, norte do ES, e migraram para Rondônia com os dois filhos. Em Rondônia se instalou no município de Alta Floresta D’Oeste onde comprou cinco hectares de terra. Vantuir lembra que no início os obstáculos foram muitos. Feita a derrubada da mata as primeiras lavouras foram implantadas a partir de mudas de sementes, mudas lavadas como diziam na época.

Com o tempo o solo foi se esgotando e foi preciso iniciar o uso de adubação química e irrigação, uma vez que o período de seca na região coincide com a flora do cafeeiro. “Situação que só mudou com a adoção das mudas clonais e uso de tecnologias como correção do solo, adubação, irrigação, podas programadas, entre outras”, salienta Danielly Dubberstein, engenheira agrônoma e filha de Vantuir.

Vantuir Dubberstein deixou São Gabriel da Palha, norte do Espírito Santo, em 1989, e migrou para Rondônia com a família – mulher e dois filhos, se instalando no município de Alta Floresta D’Oeste. Hoje, possui ao todo, 10.500 plantas de café em produção. Foto: Divulgação

Terminada a colheita deste ano a família comemora os números de 2019. “A safra de 2019 foi bem maior que 2018, com um aumento na produção de 100 sacas em relação ao ano anterior. Esse aumento se deve principalmente a primeira colheita comercial de uma lavoura de 4.200 pés de café”, ressalta Dubberstein. Ao todo, são 10.500 plantas em produção.

Quem também fez esse caminho foi o casal Laerte e Sofia Braun de Vila Pavão. Em 1977 se mudaram para Alto Alegre dos Parecis, município 720 quilômetros de Porto Velho, capital de Rondônia. Em busca de um futuro melhor Laerte, assim como Vantuir, diz que o início não foi fácil. “Precisamos derrubar muita mata, preparar a terra e depois plantar, naquela época até semente era difícil pra gente ter”, explica Braun.

O tempo passou, o casal formou família, inovou na produção, e as histórias de dificuldades deram lugar ao sucesso. Com 50 mil plantas de café em uma área de 15 hectares, a família colhe em média 120 sacas de conilon por hectare. Em 2014 o café produzido por Marcelo Braun, filho de Laerte, ficou em 3º lugar no Concurso de Qualidade do Café de Rondônia.

“Para nós é motivo de muito orgulho. É muito importante mostrar que o Estado tem potencial para produzir café de qualidade e agregar valor ao nosso produto. É gratificante poder ajudar nosso Estado”, comenta Marcelo.

De Rio Bananal, também no norte do ES, para cidade de Alvorada do Oeste, em Rondônia, Geraldo Jonacir Casteluber foi ainda solteiro com seu pai Antônio Casteluber em 1987, e só voltou um ano depois para buscar sua noiva Maria do Socorro de Souza Casteluber. Ao lado do pai trabalhou de meeiro até começar comprar os primeiros alqueires de terra.

De Rio Bananal para a cidade de Alvorada do Oeste, em Rondônia, Geraldo Jonacir Casteluber possui mais de 130 mil plantas de café, destes 70 mil produzindo. É pioneiro na cafeicultura na região onde mora. Foto: Divulgação

Mais de 30 anos depois, a propriedade da família ocupa uma área de 60 hectares, 20 ha só de café conilon. São mais de 130 mil plantas de café, destes 70 mil produzindo. Pioneiro na cafeicultura na região onde mora Jonacir diz que não foi fácil, mas tudo que tem hoje veio do café. “Passamos muitas dificuldades, trabalhamos para formar as lavouras, mas hoje tudo que tenho foi o café que me deu”, comenta Casteluber.

Fonte: Conab, 2018 – Nota: Estimativa em janeiro 2018

Além da produção de café, há seis anos, com o apoio da Emater-RO, montou um viveiro de mudas de conilon com capacidade para produzir em média 800 mil mudas por ano. “Eu procurava conhecimento sobre a produção de muda e via a necessidade. Os produtores daqui andavam até 300 quilômetros para achar muda e quando achava tinha que encomendar para entregar até um ano e meio depois”, explica. Jonacir tornou-se referência na produção de mudas de conilon em Rondônia e vende para todo estado.
Durante a 8ª Rondônia Rural Show, em meados de maio, Jonacir e o filho Jordy Casteluber assinaram parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Embrapa Rondônia, para produção e comercialização de mudas de 10 novos cultivares de Robustas Amazônicos lançados durante o evento.

Desde criança lidando com o cultivo de café e sempre em busca de novidades, especialmente em seu estado de origem, Jonacir é também uma referência no assunto dentre os cafeicultores menos experientes. “Minha vida toda só mexi com café, sempre que posso e acho necessário vou ao Espírito Santo em busca de aprender alguma coisa nova, e as pessoas aqui da região vem até mim em busca desse conhecimento, me pedem para ver suas lavouras, me sinto muito feliz com isso, e passo para os outros o que eu sei”, conclui. (Matéria publicada na 79ª edição da Revista Procampo)

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