Desafios e potencialidades no cenário capixaba
Aviação Agrícola. O nome remete à atualidade e provavelmente você já tenha ouvido/visto falar ou “sobrevoar” o território capixaba. Assunto constante de muitas polêmicas na sociedade civil e política, especialmente no que se refere às legislações federais e estaduais que regem a atividade, a tecnologia também vem abrindo mercado por conta das potencialidades para o avanço do setor agro no Estado.
Atualmente, o Brasil comemora o fato de ter a segunda maior frota de aviação agrícola do mundo, perdendo posição apenas para os Estados Unidos. No ano passado, eram 2.115 aeronaves, 2.108 delas aviões, de acordo registro Aeronáutico Brasileiro – RAB da Agência Nacional de Aviação Civil – Anac, o que significa aumento de 1,5% na comparação com 2016 e de 46,2% nos últimos dez anos. Com 464 aeronaves, Mato Grosso é o estado com a maior frota do país. Rio Grande do Sul (427) e São Paulo (312) vêm na sequência.
De acordo com dados do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola – SINDAG, no Brasil, há 244 empresas de aviação agrícola que detêm quase 68% da frota nacional ou 1.435 aeronaves; 659 aviões estão sob controle de 565 operadores privados – agricultores e cooperativas que possuem seus próprios veículos e os outros 21 aviões pertencem ao governo federal, a administrações estaduais ou ao Distrito Federal. Vale lembrar que aproximadamente 60% da frota foi fabricada pela brasileira Embraer.
No Espírito Santo, segundo informações do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo – Idaf, operam duas empresas de aviação agrícola, a Aeroterra (com sede na Bahia) e a capixaba Aeroverde. O cenário é apontado como promissor para esta atividade e para o crescimento do setor agro capixaba.
De acordo com a opinião do engenheiro agrônomo José Adilson de Oliveira, que atua como Consultor Técnico da Câmara Especializada de Agronomia – CEAGRO e no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo – Crea-ES, potencialidades maiores podem ser identificadas na região norte do Estado, onde as condições topográficas e as maiores extensões de áreas favorecem o uso da aviação agrícola. Ainda segundo o engenheiro agrônomo, verificam-se maiores limitações nas regiões sul e serrana por conta do relevo, do tamanho das propriedades e do tipo de culturas, o que acaba por aumentar os impedimentos legais e operacionais e reduzem a viabilidade e a segurança do uso da aviação agrícola.
Como funciona
A pulverização é planejada de acordo com a necessidade do produtor rural. A especificação técnica da aplicação é baseada em critérios relevantes, como condições do clima, área, objetivo, etc. O engenheiro agrônomo e o piloto planejam os métodos de aplicação corretos de acordo com o alvo biológico que o produtor quer atingir (praga ou doença). O volume da calda, o tamanho da gota, e outros elementos da aplicação, serão definidos seguindo a característica daquela aplicação.
A área é definida levando em consideração algum sistema de projeção e as coordenadas limites são delimitadas, o que auxilia no planejamento dos profissionais. A manipulação dos produtos é realizada pelo piloto e auxiliares de pista com os devidos Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s).
Para realizar a aplicação aérea, alguns fatores externos são verificados através de aparelhos que medem fatores do clima. A temperatura dever ser menor do que 30ºC. Por isso, em muitos casos, a aplicação é realizada logo no início do dia, bem cedo, quando a temperatura ainda está dentro dos padrões. A umidade relativa do ar deve estar acima de 50% e os ventos devem estar na velocidade entre 2 e 10 km/hora.
Empresa capixaba
Única empresa genuinamente capixaba, a Aeroverde, que hoje conta com três aviões agrícolas, foi criada entre 2006 e 2007, a partir da percepção de mercado em potencial no estado, especialmente para executar o serviço de aplicação de defensivos agrícolas e afins em lavouras de café conilon.
Perguntado sobre o perfil dos clientes da empresa no Espírito Santo, o consultor e coordenador em aviação agrícola da Aeroverde, Felipe Diniz, explica que a procura pelo serviço está mais ligada à topografia da região e adequação à legislação em vigor do que propriamente da vontade do produtor.
“Fazemos em torno de 600 propriedades entre café, banana, cana e eucalipto no norte do estado. É importante lembrar que o Espírito Santo é um estado com grande produção de café conilon e a particularidade desta lavoura é deitar os galhos, impossibilitando o trânsito de máquinas nas áreas. Desse modo, a tecnologia da aplicação aérea se torna uma grande aliada do produtor para controle de pragas, doenças e adubações. Além das culturas de banana, cana de açúcar, eucalipto entre outras”, conta ele.
Ainda segundo o consultor, são grandes as vantagens da tecnologia a rapidez e a eficiência, uma vez que as aplicações são realizadas somente dentro de um envelope climatológico (temperatura, umidade relativa e velocidade do vento) recomendadas nas bulas dos produtos. Para além disso, uma equipe especializada em aplicação com aviões contribui para efetividade do serviço e a utilização de menor quantidade de defensivos.
A aviação agrícola também tem grande potencial para atuar com controle biológico. Felipe conta que tem tido expressiva demanda nas culturas de cana de açúcar com aplicação de Metarhizium anisopliae para o controle da cigarrinha e no eucalipto com aplicação de Bacillus thuringiensis para o controle de lagarta desfolhadora.
Justamente sobre este tema, Felipe lembra de um fato curioso e que envolve a discussão acerca da ‘nova lei dos agrotóxicos’: a legislação em vigor não contempla a separação de produtos biológicos e sintéticos. Sendo assim, grande parte das aplicações feitas pela empresa em que trabalha – isto é: aplicação de produto biológico para controle de lagarta desfolhadora na cultura do eucalipto -, é computada como aplicação de defensivo agrícola.
Há ainda mais potencialidades dessa tecnologia que são pouco conhecidas, como combate a incêndios e plantio de pastagem, controle de vetores de doenças como a dengue, povoamento de cursos d’água e reflorestamento em locais de difícil acesso. O consultor da Aeroverde também indica que uma tendência para o setor também é a utilização de drones para locais onde os aviões não conseguem chegar, bem como outros casos específicos. Segundo ele, a empresa já começa a estudar sobre a questão enquanto aguarda a legislação específica para esta atividade.
Legislação e fiscalização
Toda empresa que, sob qualquer forma, inclua a exploração da aviação agrícola em seus objetivos ou a realize em consonância com os interesses de sua exploração agropecuária fica obrigada ao registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa.
Além da empresa prestadora de serviços aeroagrícolas, todo agricultor, empresa rural ou cooperativa que seja proprietário de aeronave agrícola também fica obrigado a se registrar no Mapa, e será autorizado apenas a realizar operações em áreas próprias, não podendo prestar serviços a terceiros.
Além disso, o Mapa pode delegar a realização de cursos de formação de Piloto Agrícola – CAVAG, Coordenador de Aviação Agrícola – CCAA para engenheiros agrônomos e, Executor de Aviação Agrícola – CEAA para técnicos agrícolas. Sendo assim, a fiscalização direta sobre o uso de defensivos e demais atividades compreendidas pela aviação agrícolasão da alçada do Mapa e, portanto, são tratadas, no estado do Espírito Santo, pela DPDAG/SFA-ES.
Segundo informações deste órgão, as principais atividades atualmente desenvolvidas pela DPDAG-ES sobre esta questão, são: Registro e autorizações para empresas de aviação agrícola atuarem no Espírito Santo; Fiscalização sobre a sede das empresas; Verificação da regularidade das aeronaves junto a Agencia Nacional de viação Civil – ANAC; Fiscalização de toda a estrutura física e documental das empresas; Fiscalização da regularidade dos funcionários que prestam serviços a estas empresas como pilotos, agrônomos e técnicos e a fiscalização sobre o uso de produtos químicos na aviação agrícola. Neste último caso, quando a apuração fiscal identifica que se trata do uso de agrotóxicos é encaminhado ofício ao Idaf para que promova o seu devido processo legal dentro de sua competência.
Com a palavra, os produtores que utilizam a aviação agrícola
Nivaldo Andrade Vieira cultiva café e banana em uma área de aproximadamente 73 hectares em Jacupemba, distrito do município de Aracruz. Ele considera imprescindível a utilização da aviação agrícola, especialmente, por conta da segurança. De acordo com ele, a pulverização tratorizada leva mais tempo e tem o contato direto dos funcionários com os defensivos agrícolas. “Com a aviação agrícola, em menos de uma hora é realizada a aplicação, considerando o horário ideal e também o fator climático. Com isso, também a segurança dos funcionários é resguardada. É bem mais prático e consciente trabalhar assim”, afirma.
O produtor também destacou a importância de que a aviação agrícola seja realizada respeitando a legislação, as distâncias necessárias em relação aos riscos, à população, dentre outras questões. “Muito se discute e se condena antecipadamente a aviação agrícola. Há muito preconceito. E pouco se fala sobre os perigos que a não utilização da aviação agrícola pode trazer aos funcionários. Em ambos os casos existem regras a serem cumpridas e cuidados a serem tomados. Mas, para mim, é fato que a aviação agrícola traz menos danos”, enfatiza.
Paulo Saguita também cultiva banana na região de Linhares e utiliza a aviação agrícola há cerca de 10 anos. De acordo com ele, no que se refere ao cultivo de banana, a aviação agrícola é muito mais eficiente e segura, uma vez que as plantas são de porte alto e a pulverização tratorizada oferta resultados mais limitados (até porque o próprio trânsito das máquinas é limitado).
Além disso, de acordo com ele, o custo-benefício da aviação agrícola é bastante significativo. Paulo está seguro de que a adesão deste tipo de pulverização foi um passo importante na profissionalização de sua produção e também para qualidade da banana, que chegará ao mercado.
Também em Linhares, Branco Malaquini utiliza a aviação agrícola há cerca de 8 anos em sua lavoura de café e está muito satisfeito. “Em cerca de 20 minutos é possível fazer a aplicação dos defensivos em toda a área. Além disso, o aproveitamento é de 100% pois tudo é calculado de acordo com cada área. A hora certa, os fatores climáticos, como o vento, entre outros. Não vejo pontos negativos nessa estratégia.”, destaca ele.
Reportagem publicada na 76ª edição da Revista Procampo (Nov/Dez 2018)